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Pulvi es(et pulverem reverteris)

-Veja!
-Me olha, me inveja, me copia!
Enquanto a humanidade se enfuna do seu próprio ego
Num grotesco festival de abastardamento e autofagia
Esquecemos as adversidades com sabores diversos
Babando na mesa com a voracidade ensandecida
Bobos e extasiados com versatilidade do menu

Com tola infantilidade de por na boca o que na mão possui
Devoramos a vermelhidão suculenta da carne
Tão charmosa, tão gostosa, irresistível, irrecusável!
Levados pelos prazeres óbvios, obscenos, imediatos
Escravizados pela alternativa efémera, fácil, fugaz
Padecemos do hábito irremediável de ser humano
Completamente falível, alheio, perdido, vulnerável

Certamente, um dia, tudo estará arruinado.
Da inevitável decadência, ninguém escapa!
No final iremos todos juntos para o inferno
Com a boca suja de diamante, ouro e prata
Lambuzados, felizes, sorridentes de mãos dadas
Lavaremos nossas almas putrefatas
Na frieza da fogueira mais ingrata!
Aquela que não discrimina, nem vê nada

Que assim seja!
Somente assim para acabar com a sobeja
Que a profecia desça dos céus
Sobre todas nossas cabeças
E pese sobre nossos ombros
Até esmagar toda essa prepotência

Que a severa voz, implícita e misteriosa
Que ora ignoramos, ora fingimos ignorar
Venha ordenar nossa despeja. Dirá:
- Saiam todos! Acabou a brincadeira!
Que aqui fiquem os quais aqui o mereça

Na sesta da nossa última ceia
Serviremos de alimento aos nobres herdeiros
Filhos das entranhas da terra
Dignos dela e de sua casta riqueza:
Comemoram os vermes e as amebas
Celebram as traças e as bactérias

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