Pular para o conteúdo principal

Excentricidade

Se, porventura, eu enloquecesse
Sendo louco logo abandonaria
O sentido habitual da palavra.
Ao "sem sentido", empregaria
O legítimo âmago do significado

Se, por acaso, eu enlouquecesse
Atingiria um degrau acima do insensato
Onde até os loucos atuais balbuciam
Desnorteados pela altura inalcansável
Trepidam por não se saberem soltos
Ora! Olhe de cima pra baixo e vede
Quem é pra ser, que, de fato, sede

Se, na imprudência, aventurasse
Quereria ir além e sempre mais
Obstinado pela natureza do absurdo
Consumado pelo desejo contumaz.
A conjuntura do todo seria pouco
Pra quando me intitulasse louco

Costumávamos ser todos loucos
Mas a covardia educou-nos a alma
A insanidade padece enclausurada
Sufoca numa casca espessa e polida
Abafou-se a voz veemente intrínseca
Que contudentemente gritava e feria
Mais alto que todas as razões da vida

Esses loucos de hoje em dia...
Já não deliram mais sozinhos
Não conversam mais consigo
Perambulam meticulosamente
Domados, amestrados, mesquinhos
Por um único e aberto caminho
 

Mitigou-se os antigos ímpetos
Morreu, a loucura inerente
Nada de mais puro existe
De livre, espontâneo e inocente...

Comentários

  1. ..."Se, por acaso, eu enlouquecesse
    Atingiria um degrau acima do insensato".
    Atualmente, há momentos em que torna-se necessário atingir esse degrau.

    Parabéns, poeta!
    Um abraço

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

O Desejo da Puta

A puta observa o dinheiro deixado na penteadeira Ela fixa o olhar com certeza de que está tudo ali Mas com a desconfiança vazia de lhe faltar algo... Ela vê o conserto da goteira do seu quarto fétido Um novo vestido,maquiagem, novos lençóis e cortinas O arroz e o feijão, fralda e leite ninho para o menino Que chora ao pé da cama recém-usada, alheio ao destino “O que será? Eu contei errado?” -pensa ela Tomada por uma mágoa mórbida, ela descobre Está tudo ali: a sobrevivência de um novo dia. Faltava-lhe apenas a vontade de viver um outro dia...

Caravana

É grande o peso que carrego? Não importa. Se tiver que levar, eu levo Se não conseguir andar, arrasto Se, de repente, cansar, eu paro Mil anos parado, aguardo... Enquanto há fôlego, há pulso Mesmo parado, prostrado Eu continuo! Grande é o peso que carrego... Se tiver terra onde errar, eu erro Se tiver pecado pra pecar, eu peco Se não puder falar, escrevo Se estiver escrito, apago Se não puder escrever, eu penso Mesmo que seja proibido Se tiver que fazer, eu faço! O peso é grande, mas eu o carrego... Carrego porque sou levado Pois algum dia, quem sabe, levanto Levanto porque sou erguido Erguido pela força de mil braços Clamor ao céu leva o suplício Mil gritos urgem atrás dos tímpanos “Continua…” Continua porque a vida não é minha Ela quem nasce, cresce e caminha Caminha porque me é alheia Força que Deus provê e determina Eu, apenas, um acidente na areia Continuo porque é minha sina Uivando, gemendo, pedindo Levado porque a natureza quer e precisa ...

PAPO LITERÁRIO, TV CEARÁ

Olá, amigos recentemente tive a felicidade de ter um poema declamado na TV Ceará, programa Papo Literário. O poema chama-se "Um ponto de eternidade" do livro "Impressões". Confiram no link abaixo: Um Ponto de Eternidade Enquanto seu cabelo me cobrir Enquanto seu cheiro me perfumar Cada minuto será um sonho A se realizar... Enquanto você sorrir Enquanto me beijar E sorrir e beijar Ao mesmo tempo, impensado Será teu! Meu tempo, meu espaço Todo momento, em todo lugar... Você é um instante fora daqui Fora da circunfluência sem fim Um ponto que me tange Num ponto de eternidade... ________________________________________________________________________ Abraço a todos